O
Brasil era aquele tipo de cara trabalhador. Manja? Acordava as cinco da manhã e
só se recolhia para a cama por volta das duas horas da madrugada. Carregava o
peso e o tempo dos seus 65 anos de idade e uma grande família de seis filhos e
diversos netos. Estudara muito pouco, na vida. Em dias atuais, seus estudos não
lhe dariam um diploma do ensino fundamental. Desde cedo, dedicou – se ao
trabalho, mesmo que informal, muitas vezes escravo. Homem de fibra, como diria
os famosos ditos populares, “ matava um leão por dia, vivia se virando”.
Certa
feita, inventou de repassar um equipamento de som usado a preço de coisa nova,
daqueles que tiramos da loja com a embalagem bonita,cheirosa e a nota fiscal
bombando. Sem perceber, pobre coitado, era o seu fim, a última cartada de uma
longa jornada de trambiques e falcatruas! O cliente era um antigo colega de
escola, que Brasil muitas vezes surrava por entre um recreio e outro. Ora, por
que o homem tinha tanta felicidade em surrar um colega, o leitor deve estar pensando?
Digo: tal colega era muito menor em proporções corporais em relação ao Brasil,
daí o impulso à violência a o uso desproporcional da força. O Brasil era
grande, com a estrutura corporal de um espartano de tempos remotos, um completo
homem treinado e habilitado para atuar na guerra.
Voltando
ao aparelho de som, Brasil era mestre em efetivar diversos tipos de negócios.
Todos eles de forma a ganhar uma parte gorda em cima dos produtos negociados.
Então, costumava superfaturar sobre qualquer coisa que estivesse em sua posse e
quisesse negociar. Pois que, este som, era um dos poucos produtos que Brasil
não ganharia nada em cima! A intenção era vender o parelho pelo mesmo preço de
um novo, mesmo sabendo que ele já havia sido utilizado.
Brasil
era um brasileiro nato, típico malandro que puxava um assunto com qualquer
pessoa para ganhar um lugar mais adiantado na fila do banco, ou para ganhar um
voto em processos eleitorais, se quisermos fazer referência aos nossos pleitos tão
“democráticos”. Não entendia de futebol? Sem problemas, resumia o que o
interlocutor havia dito com outras palavras, uma “enrolação”. Um cara que
andava com um isqueiro no bolso para prozear com qualquer fumante com a
intenção de vender os seus produtos. Assim ele vivia desde pequeno e, agora,
aos 65 anos, nada tinha de novidade. “Velho Brasil de guerra”, diziam os
companheiros de cervejada!
Então,
numa noite de sábado qualquer, retornava de mais um dia de trabalho extenuante.
Era noite cerrada e poucas pessoas circulavam. Seu ex – colega era uma delas,
inclusive caminhava na sua dirção. Brasil caminhava a passos largos, muito
menos por medo; mas mais porque desejava chegar logo em casa. O homem se
aproxima:
_
Brasil, velho companheiro! Como andas?
O
velho Brasil reconhecera aquele homem que há tempos não via. Estava estranho,
com a barba longa, um chapéu grande e os cabelos extremamente compridos.
_Pois
então, o que tens de novo?
Os
dois travaram uma longa conversa que atravessou a madrugada inteira. A família
do Brasil já avisara a polícia do desaparecimento do homem, visto que o relógio
apontava 9 horas da manhã e nem um sinal dele. E nada, ninguém conseguia entender
o paradeiro daquele cidadão nem tão honesto, mas peleador. Isso só foi possível
dois dias depois, quando o corpo do homem foi encontrado por policiais em uma
estrada próximo à residência onde a sua família morava. Marcas de tiros
marcavam – lhe a face e facadas cortavam – lhe o peito. Junto ao corpo, um
bilhete com os dizeres, a sangue seco:
“Sabemos,
não foi apenas por causa de um aparelho de som...”
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