quarta-feira, 18 de agosto de 2021

Pátria, família e liberdade?

          
         Pátria, família e liberdade?

Marcelo tomava café com o seu pai em uma confeitaria no centro histórico da cidade de Porto Alegre. Era um lugar boêmio, onde estudantes costumavam se encontrar para fazer trabalhos escolares, acadêmicos e para discutir sobre assuntos diversos. Entre eles: política.

Ao solicitar o adoçante ao atendente do estabelecimento, o pai advertiu o jovem:

_ Mas meu filho, tu não podes dar assunto pra esse tipo de gente! São pessoas que querem a baderna generalizada, uma vida desregrada. Pense bem, tudo o que desejam é uma sociedade onde os bandidos estejam por aí, a amedrontar o cidadão de bem!

Com toda calma, Marcelo lambe os beiços e, com a ponta língua, retira meia dúzia de farelos de pão que se encrustavam em seu longo bigode:

_ Mas o que o senhor, meu pai, entende como cidadão de bem? Os ricos empresários que sonegam vultuosos impostos mas viram heróis por pagar um salário miserável aos seus empregados para manter sua riqueza a custo de oferecer um emprego como se fosse favor?

O pai tentou interromper, mas o jovem largou delicadamente a xícara que conduzira à boca na rústica mesa e continuou com sua voz fina, porém, demais afinada:

_ Ou seria, meu bom pai, o cidadão de bem aquele que destrói a educação do seu povo o alçando aos profundos mares da ignorância enquanto compactua com defesas bélicas como se a pólvora fosse mais forte que todo e qualquer governo de todos e suas instituições democraticamente eleitas por nós? Pois, não há nesse mundo força que vai calar a gana democrática daqueles que perderam milhares de entes queridos, amigos e familiares nas tiranias anteriores, meu pai!

Suando frio, o senhor de aparência elegante saiu de si:

_ Meça as suas palavras pra falar comigo, afinal de contas, você me deve a sua vida e sou o seu pai. Não é defendendo esses corruptos e canalhas que você, meu filho vai se destacar na vida! Siga exemplos de homens fortes, que defendem a pátria, a família, a liberdade; bens irrenunciáveis que jamais poderemos deixar de lado! Você precisa evoluir meu filho, nem tudo o que a modernidade apresenta quer dizer um passo à frente!

Com suavidade na voz e com um gesto de muito carinho, Maurício olhou para o seu pai com um semblante apaziguador, colocou a mão sobre o seu terno, na altura do ombro direito e disse:

_ Meu pai, hoje, a família tradicional atira seus filhos pela janela de altos prédios para se livrarem como se os filhos fossem um encosto; a família tradicional acorberta atos criminosos dos seus filhos por puro capricho e, pasmem meu pai, manda assassinar o companheiro sem a menor piedade por interesses cretinos!

E segue:

_ Pátria, meu pai? Estão entregando todos as nossas riquezas para potências estrangeiras como os portugueses assassinos fizeram durante a nossa colonização! Isso não é ser patriota; mas, idiota! Quanto à liberdade, ninguém consegue tal intuito no meio de mentiras, onde milhares de pessoas são pagas para disseminar inverdades, denegrir a imagem e a honra de pessoas de bem e atentar contra as nossas instituições. Pois, meu pai, existe algo muito errado nisso tudo. Parece que existe um mundo paralelo e que jamais navegaremos pelo mesmo oceano!

Já em posição de retirada, o pai do jovem, levantando-se vagarosamente, abraça o filho com um olhar de indignação:

_ Pois saiba que eu continuarei acreditando no Brasil! Continuarei acreditando nos princípios políticos que combatem a corrupção dentro dos governos; continuarei ao lado dos patriotas e dos cidadãos de bem!

Com um aperto no abraço, Maurício fala bem baixinho ao ouvido do pai:

_ Seguiremos, então, caminhos distintos, meu grande pai; o senhor, em direção ao centrão; eu, sempre, à esquerda!

E partiram, um pra cada lado.